Relatos da informalidade: cuidar do povo é responsabilidade do Estado
Mães e avós que sustentam sua família passam por um dilema: viver seguras em casa ou se arriscar pra sustentarem os filhos?
Enquanto Bolsonaro quer primeiro salvar a economia, apesar das milhares de mortes já anunciadas com a pandemia do Coronavirus, o povo pobre e trabalhador teme pela vida dos seus. São famílias que estão nas quebradas dos grandes centros urbanos, trabalhadores informais e mesmo aqueles que têm carteira assinada, todo mundo à mercê de uma pandemia sem precedentes, mas com um Estado comandado por um governo incapaz de reagir à altura.
Flavia Soares, do Centro de São Paulo, moradora da Ocupação 9 de Julho, relata que já que tem tido trabalhos recusados como diarista em função do medo da contaminação. “Eu trabalhava como diarista e com essa epidemia o povo não quer mais que eu vá nas casas fazer limpeza, com medo da contaminação. Com isso eu não tive mais o sustento dos meus filhos e da minha casa”, explica, alertando que, assim como ela, outros vizinhos estão na mesma situação.
Flavia e outras tantas fazem parte de uma estatística crucial: são mulheres, mães e avós, provedoras economicamente em seus lares, condição da maioria das casas brasileiras. Para a vendedora ambulante Elizângela Rodrigues, de 45 anos, não poder sair de casa devido à quarentena impõe um dilema para a mãe e avó que sustenta sua família: viver segura em casa ou se arriscar pra sustentar os filhos?
“Quem trabalha como vendedora ambulante não pode sair. Aí você não sabe se fica dentro de casa ou se vai ganhar o ganha-pão dos filhos, né? Onde eu pego ajuda são as igrejas, que estão tudo fechadas, todo mundo em quarentena, não estão recebendo ninguém, e fica difícil pra mim com as crianças e com dois netos”, conta a vendedora, que também vive na Ocupação 9 de Julho, na região central da capital paulistana.
Falta de responsabilidade
Enquanto isso, o Governo Bolsonaro já tem demonstrado nitidamente de que lado se coloca no atual momento de crise sanitária, de saúde e social. Dos R$ 145 bilhões de créditos ofertados por Guedes e Bolsonaro num pacote de ajuda, apenas 15% vai ser destinado para pequenas empresas. Uma fatia para os menores e o bolo inteiro para o bolso dos ricos, se aproveitando de uma situação de calamidade.
Segundo Gilson Rodrigues, presidente da União de Moradores e Comerciantes de Paraisópolis, a situação na favela é preocupante: existe um abandono estrutural e que se reafirma durante o descaso dos governantes com as comunidades periféricas. “Muitas casas não tem banheiro, então a situação é muito grave e precisa se pensar alternativas, um plano específico com os governos municipais, estaduais e federal para as favelas deste país.”, apela o líder comunitário.
Mesmo aqueles trabalhadores que estão formalmente empregados estão sob ameaça de seus empregadores em consonância com o Governo, que já propôs até a redução do salário em 25% sem redução da jornada e a exclusão de sindicatos das negociações neste momento de crise generalizada.
O dono das lojas Havan, empresário muito próximo de Bolsonaro ameaçou demitir mais de 22 mil trabalhadores formais. E não se pode esquecer que a primeira vítima fatal do Coronavirus no RJ foi uma empregada doméstica que trabalhava para uma patroa que viajou para Itália e lhe transmitiu o vírus.
A reação dos trabalhadores
As centrais sindicais se reuniram virtualmente nesta segunda-feira, 23, e divulgaram suas propostas como medidas emergenciais para amparar os trabalhadores formais, informais e o povo pobre do país durante a pandemia do Covid-19.
“Nós vamos dialogar com a população para dar uma resposta contundente às medidas do Bolsonaro, que mais uma vez preserva o lucro das grandes empresas enquanto coloca a maioria da população sem nenhuma assistência”, adverte Edson Carneiro Índio, presidente da Intersindical.
Entre as propostas das entidades sindicais para acolher, durante a crise, tanto trabalhadores formais como informais estão a destinação de renda mínima de R$ 500 e o aumento das parcelas de seguro-desemprego para os demitidos, enquanto durar a pandemia. As centrais também propõem
1) Assegurar fornecimento de água, luz, telefone, tv e internet;
2) Incentivar acordos coletivos que preservem os salários e os empregos durante a pandemia;
3) Criar Fundo de Emergência para, durante a crise, garantir um salário mínimo mensal para desempregados, informais e conexos;
4) Acelerar o processo de concessão de aposentadorias, solucionando imediatamente milhões de processos pendentes;
5) Regularizar os beneficiários do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada;
6) Criar linhas de crédito e financiamento para os setores obrigados a paralisar suas atividades, com a contrapartida de manutenção do emprego, salário e direitos;
7) Articular com o Congresso Nacional e todos os governadores, independentemente da filiação política e ideológica.
Para aqueles que precisam seguir trabalhando, como explicou em vídeo divulgado no início da semana o ex-presidente Lula, “o papel dos políticos e do governo é de cuidar do país. E cuidar do país significa cuidar do povo, de muita gente que está desempregada neste país e precisa sobreviver durante o combate ao coronavírus”.
Confira esses e outros depoimentos no Gente que luta desta semana: