Foto - Mayke Toscano/Secom-MT

O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, chocou o Brasil e o mundo ao defender a flexibilização da legislação ambiental em meio à pandemia do novo Coronavírus. A fala do ministro, que se tornou pública pela decisão Supremo Tribunal Federal (STF) em liberar vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, se torna ainda mais absurda pela proximidade do Dia Mundial do Meio Ambiente, comemorado no dia 5 de maio. A gestão de Salles é considerada pelas entidades de meio ambiente como desastrosa e um retrocesso para as leis ambientais do país.

No vídeo, Salles sugere aos demais ministros aproveitar a distração da mídia com a pandemia para “passar a boiada”.

“Então pra isso precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de COVID e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação, é de regulatório que nós precisamos, em todos os aspectos”, disse o ministro na famigerada reunião.

Após a divulgação do vídeo a reação dos organismos de defesa do meio ambiente foi imediata. Para o Instituto Social Ambiental (ISA), a confissão de Salles constitui prova para eventuais questionamentos judiciais, inclusive sobre improbidade administrativa ou crime de responsabilidade, sobre os atos antiambientais que vem praticando. “Mais difícil será reparar o dano da comprovação, perante a opinião pública e os fundos internacionais de investimentos, de que não há governança ambiental e segurança jurídica sob a égide desse governo”, afirma o editorial do Instituto.

Arte por Gladson Targa/Comitê Nacional Lula Livre

Multas ambientais suspensas

Desde que assumiu, Bolsonaro tem criticado os órgãos de proteção ambiental e prometeu acabar com a “farra” das multas por crimes ambientais. A suspensão efetiva de multas é apenas uma entre várias medidas que o atual governo adotou para enfraquecer a aplicação das leis ambientais e a proteção do meio ambiente. Em um ano e meio de governo, o MMA exonerou funcionários do Ibama, enfraqueceu legislações ambientais e de proteção de áreas indígenas e quer implementar uma regularização fundiária que institucionaliza a grilagem na Amazônia. Salles está correspondendo bem às expectativas do chefe.

As multas por desmatamento ilegal na Amazônia do Brasil, desde outubro de 2019, foram praticamente suspensas, sob um decreto de Jair Bolsonaro, conforme relatório da ONG Human Rights Watch, divulgado no dia 20 de maio.

Em outubro de 2019, o governo estabeleceu que as multas ambientais devem ser revistas em audiências de conciliação, nas quais os autos de infração podem ser anulados. O MMA estabeleceu a suspensão dos prazos para pagar essas multas até que a audiência de conciliação seja realizada. Antes disso, os fiscais aplicavam as multas na hora.

Isso significa que, na prática, estão suspensas milhares de multas contra os que destroem o meio ambiente, somando R$ 412 milhões. A legislação brasileira prevê que as penalidades prescrevem após cinco anos e, em certas circunstâncias, em três anos. Após esse período, os infratores não precisam mais pagá-las.

Aumento do desmatamento na Amazônia

Alertas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) mostram que o desmatamento disparou na Amazônia. Segundo o Inpe, houve aumento de 53% na área desmatada na região amazônica entre outubro de 2019 e abril de 2020, comparado com os alertas no mesmo período de 2019.

Somente no mês de março de 2020, início do isolamento social, houve um aumento de 29,9%, a segunda maior taxa para o mês nos últimos 5 anos, atrás apenas de 2018, quando Bolsonaro foi empossado.

Despacho do MMA desrespeita a Lei da Mata Atlântica

No dia 06 de maio, por meio do Despacho nº 4.410/2020 – do MMA – o governo Bolsonaro recomendou aos órgãos ambientais (Ibama, ICMBio e Instituto de Pesquisas Jardim Botânico) que desconsiderem a Lei da Mata Atlântica e apliquem regras mais brandas constantes do Código Florestal para áreas ditas consolidadas nas regiões de domínio da Mata. Na prática, essas áreas são aquelas com atividades econômicas que exploravam terras antes da Lei. Com esse despacho, não precisarão mais recuperar áreas consideradas irregulares e ilegais pela Lei da Mata Atlântica.

“O desrespeito à legislação ambiental é flagrante nesse governo de retrocessos e desmandos. Não vamos permitir danos à Mata Atlântica, casa de mais de 140 milhões de brasileiros. Temos denunciado que continuam tirando o verde da nossa Terra e contra atos criminosos como esse temos que agir”, afirma Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.

Extinção de bases do Projeto Tamar no Nordeste

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, subordinado ao Ministério do Meio Ambiente, de Ricardo Salles, extinguiu três bases avançadas do Projeto Tamar, de conservação de tartarugas marinhas, em Camaçari (BA), Parnamirim (RN) e Pirambu (SE).

A mesma portaria determina que as bases avançadas dos centros nacionais de pesquisa e conservação, o que não inclui somente o Tamar, seguirão ativas apenas se houver comprovação da necessidade de ações de pesquisa e conservação conduzidas durante todo o período do ano.

O fechamento ocorreu menos de uma semana após a divulgação do vídeo da tal reunião para “passar a boiada”.

O Projeto Tamar foi criado em 1980 e hoje é reconhecido internacionalmente como uma das mais bem-sucedidas experiências de conservação marinha.

Congresso reage e pede demissão de Ricardo Salles

Nesta quarta-feira, 3, a Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso se reuniu para tratar de temas sobre a semana do Meio Ambiente. Na pauta, o desmonte ambiental promovido pelo atual ministro Ricardo “passar a boiada” Salles. De Sarney Filho (PV) a Ricardo Tripoli (PSDB), passando por Alessandro Molon (PSB) e Nilto Tatto (PT), uma unanimidade: todos defenderam a demissão do ministro bolsonarista.

No Senado, o presidente e vice-presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), respectivamente, Fabiano Contarato (Rede/ES) e Jaques Wagner (PT/BA) acionaram o Ministério Público Federal (MPF) e a Procuradoria Geral da República (PGR) para que os órgãos apurem eventual conduta criminosa cometida por Ricardo Salles na reunião ministerial. Na ação, é solicitado o afastamento cautelar do ministro de suas atribuições.

Para o líder do PT no Senado, Rogério Carvalho, a atitude do ministro do Meio Ambiente contrasta com aquele Brasil que foi protagonista internacional nas discussões sobre o meio ambiente durante os governos Lula e Dilma. “O Brasil se tornou nos governos do PT uma potência ambiental inquestionável. Fomos um dos construtores do conceito de sustentabilidade. Não precisamos agredir o ambiente para crescer, apenas adotarmos políticas públicas efetivas.”