Brasil lamenta a perda inesperada do jornalista criador do Conversa Afiada. Leia homenagens.

Esta quarta-feira, 10, acordou milhões de brasileiros com uma infeliz surpresa. A morte por um infarto fulminante do jornalista Paulo Henrique Amorim, um dos mais proeminentes da profissão e liderança entre os blogueiros progressistas, deixou atônitas as multidões que acompanharam seu trabalho.

O criador do blog Conversa Afiada, um jornalista angustiado com a situação de perda de direitos e da soberania nacional, deixa um legado para os que aqui continuam no jornalismo, mas sobretudo um legado a todo brasileiro que preserva afeição à Democracia.

Seu estilo afiado e corajoso era marca contínua. Não se esquivava de tecer críticas aos que estão no poder, colocar o dedo na ferida entre a própria esquerda ou articular questões nacionais com o avanço (muitas vezes obscurantista), de forças internacionais, como FMI, CIA e afins.

Devido a essa persistência no bom jornalismo, era alvo recorrente de processos, que já passavam da cifra de 100. O mais falado recentemente foi impetrado pelo ministro do STF Gilmar Mendes. Na TV Record, onde trabalhou por décadas, tinha acabado de ser demitido por pura perseguição política orientada pelo próprio presidente Jair Bolsonaro.

Desde as primeiras horas desta triste quarta-feira, não param de surgir homenagens de colegas jornalistas, entidades sindicais da categoria, políticos de nível nacional e movimentos populares. Em nota, o ex-presidente Lula lamentou a morte do companheiro das trincheiras da comunicação: “A morte de Paulo Henrique Amorim não é uma perda apenas para o jornalismo. Com sua partida perde também o Brasil e sua democracia”, escreveu Lula.

Abaixo reproduzimos a homenagem do amigo, também jornalista, Luiz Nassif e a nota conjunta do Sindicato dos Jornalistas de SP com a Federação Nacional dos Jornalistas – Fenaj. Deixamos nossa homenagem, enquanto Comitê Nacional Lula Livre.

NOTA CONJUNTA DO SINDICATO DOS JORNALISTAS DE SP E DA FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo manifesta, em conjunto com a Federação Nacional dos Jornalistas, seu pesar pela morte do jornalista Paulo Henrique Amorim, ocorrida hoje (10/7).

Sindicalizado desde 1975, PHA, como era conhecido, passou por vários dos principais veículos de comunicação da imprensa brasileira em quase 60 anos de carreira, e era considerado um dos nomes mais relevantes do jornalismo nacional.

Atualmente, Paulo Henrique Amorim mantinha o blog Conversa Afiada e era funcionário da TV Record.

Crítico contundente do golpe de 2016, que afastou a presidente Dilma Rousseff, cunhou o termo PIG (Partido da Imprensa Golpista) como forma de criticar a linha editorial da chamada grande imprensa.

Há algumas semanas, PHA foi afastado de sua função de apresentador do programa “Domingo Espetacular”, da Record, e as informações dão conta de que o motivo foram as pressões vindas do governo federal, em função da postura crítica do jornalista em relação à gestão de Jair Bolsonaro.

Paulo Henrique Amorim tinha 77 anos, nasceu e morreu no Rio de Janeiro.

Ele deixa a mulher, Geórgia Pinheiro, e sua filha Maria Amorim, às quais manifestamos nossa solidariedade.

Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo
Federação Nacional dos Jornalistas

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Paulo Henrique Amorim, um jornalista de coragem, por Luis Nassif

Tornou-se um campeão do Youtube, graças à sua enorme capacidade de identificar um tema, mirar no detalhe ridículo que ninguém percebia, e fuzilar com a pontaria dos grandes polemistas.

Conheci Paulo Henrique Amorim em minha ida para a Editoria de Economia da Veja, em 1974, em uma oportunidade aberta por Paulo Totti, que era chefe de reportagem.

Ao lado de Elio Gaspari e Marcos Sá Correa, Paulo Henrique formava o trio dos jovens jornalistas cariocas, importados para a Veja e com curso superior. Se não me engano, ele era formado em Ciências Sociais.

Assumiu o cargo de Editor de Economia ao lado do inesquecível Emilio Matsumoto. Sua estreia em São Paulo havia sido pouco antes, convidado por Luiz Fernando Mercadante para trabalhar na revista Realidade. Ali, já deixara sua marca mais conhecida, um feroz espírito de competição que o impulsionava atrás de notícias.
Jovem ainda, tornou-se influente junto à área econômica do governo.

Sua carreira prosseguiu fora da Veja. Primeiro, foi escalado para dirigir a revista Exame, que fazia parte de um pacote de revistas técnicas que a Abril adquirira.

Depois, mudou-se para o Jornal do Brasil. Ali experimentou sua fase mais brilhante de jornalista, como titular da coluna Informe Econômico.

Na nova função, passou a revelar uma de suas características mais marcantes, de cunhar expressões que se tornariam motes, a exemplo de Elio Gaspari, e provavelmente inspirado no jornalismo de guerra da velha Rio de Janeiro de Gondim da Fonseca e outros. A expressão “raposa felpuda” tornou-se sua marca, além da incomparável capacidade de valorizar, pela manchete ou pelo lide, as informações mais prosaicas.

De lá foi para a TV Globo, onde também se consagrou pelos furos e pelos motes, como editor de Economia e comentarista. Não me lembro perfeitamente da maneira como anunciava informações exclusivas de Brasília. Mas fazia o telespectador participar do clima de cumplicidade, como se ele estivesse junto com Paulo Henrique em um local misterioso, arrancando informações da fonte. Competitivo, mantinha uma disputa surda com o comentarista oficial Joelmir Betting.

Era cioso de sua idade. Quando recebi um convite da Globo para ser comentarista, e foi marcado um almoço no Rio, Paulo me ligou e, na conversa, sugeriu delicadamente que eu não dissesse que havia sido seu foca na Veja. Acabei desistindo do convite e do almoço.

De lá saiu para dirigir o escritório da Globo em Nova York. Não sei as razões de sua saída. Logo foi contratado pela TV Bandeirantes para a vaga de âncora do Jornal da Band. Pouco antes, o velho João Saad me havia convidado para assumir a função. Enrolado com minha empresa, e percebendo a resistência de Johnny Saad, recusei.

Saindo da Globo, de imediato foi contratado pela UOL para apresentar um programa que ficava exposto permanentemente na home do portal. Ali, mais uma vez se revelou o pauteiro primoroso, identificando os melhores temas pela manha, conseguindo entrevistas por telefone e apresentando no programa que, se não me engano, ir ao ar ao meio dia.

De lá saiu se não me engano para o iG. Foi lá que voltamos a nos cruzar, nas guerras com Daniel Dantas.

Voltamos a nos cruzar em 2010, na campanha eleitoral, em uma frente informal contra o risco José Serra. Tinha restrições ao seu estilo, e ele devia ter ao meu. Mas foi uma guerra inclemente, em que era atacado por todos os lados.

Do lado de Serra, a pecha de chapa branca. Do lado do PT, Tereza Cruvinel me afastando da TV Brasil, suspendendo o pagamento até que aceitasse a mudança no contrato, entregando todos os programas até julho, para então encerrar o contrato. Que só foi refeito depois que Serra perdeu.

Éramos meia dúzia de blogs, cuja única afinidade era a resistência contra o perigo Serra. Acordava toda manhã sentindo o peso do mundo, e o que nos animava reciprocamente era a resistência para a luta, particularmente de Paulo Henrique.

E essa garra e coragem ele não perdeu, mesmo nos momentos mais críticos. Aliás, quanto mais crítico o momento, maior a sua coragem.

Nos últimos anos, seu estilo jornalístico encontrou o ambiente mais propício, os vídeos do Youtube. Tornou-se um campeão do Youtube, graças à sua enorme capacidade de identificar um tema, mirar no detalhe ridículo que ninguém percebia, e fuzilar com a pontaria dos grandes polemistas.

Deixa um legado de coragem.