“Não é acusação oca. É análise”

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Jessé Souza, sociólogo e autor, entre outros, do best-seller “A Elite do Atraso – da Escravidão a Bolsonaro”, fez um balanço da Operação Lava Jato em entrevista à revista Cult. Ele foi questionado, entre outras coisas, sobre a influência dos Estados Unidos no desenvolvimento da operação.

“O que acontece com a Lava Jato é que ela assume uma forma judicial de uma espécie de representação de um partido extraparlamentar, que se utiliza mafiosamente das estruturas do Estado. São máfias na Polícia Federal, no Ministério Público e na Justiça que, junto com a imprensa – boca da elite financeira -, queriam tirar o PT do poder. Para isso, era preciso destruir esse projeto de forma extra-eleitoral, dada a hegemonia eleitoral petista, e a Lava Jato foi isso. O que fizeram com Lula foi feito exatamente nos Estados Unidos contra um senador do Alasca, Ted Stevens, um caso que foi reconstruído pelos advogados de Lula. [procuradores do Departamento de Justiça americano pretendiam implicar Stevens em um caso de corrupção tendo como base uma reforma de 200 mil dólares que este havia realizado em seu chalé no Alasca. Foi inocentado em 2009]. Se você vê a mesma estratégia sendo aplicada no Brasil, por que vai precisar de um print do Telegram para acreditar?”, disse ele.

Para Jessé, não há dúvida de que Jair Bolsonaro é o produto final da Lava Jato. “Tudo o que o Steve Bannon utilizou com Trump nas eleições americanas foi utilizado por Bolsonaro na eleição brasileira sem tirar nem por. Ficou muito claro pra mim, com Bolsonaro, que o racismo racial é a linguagem como se articulam todos os outros racismos no Brasil – de classe, de raça e o racismo entre culturas”, afirmou.

O sociólogo reforça, com duras palavras, que a Lava Jato se comportou, desde o início, como uma máfia:

“(…) Sem a Lava Jato não teria Bolsonaro. A Lava Jato queria tirar o PT do poder para por o PSDB e acabou por criminalizar toda a política, o que é um terreno perfeito para o surgimento de um cara como Bolsonaro como via de salvação para a moralidade pública. Mas a Lava Jato foi desde o primeiro dia um projeto político. Moro ia para os EUA aprender com o FBI desde 2007, sete anos antes da Lava Jato. Isso foi montado. A Lava Jato foi desde o começo uma máfia. Não é uma acusação oca, é uma análise. Ela não observou nunca nenhuma ordem legal, foi criminosa e contraditou a lei o tempo inteiro por conta da blindagem midiática elitista que a protegia. E é muito importante que a gente diga que a Lava Jato não causou só uma perda em dinheiro, não acabou só com infraestrutura, com milhões de empregos, com a pujança econômica do Brasil, não só empobreceu o país. Ela destruiu consensos democráticos extremamente difíceis de construir. Muita gente deu a vida por isso, seja porque foi assassinado ou porque empenhou a vida nisso. São ao menos duas gerações que lutaram para transformar a fé na democracia num desejo de todos os brasileiros, e isso é frágil. Esses 50 anos desde a luta contra a ditadura pela democratização foi o que a Lava Jato ajudou a destruir. O Brasil tem hoje consensos autoritários, mais do que jamais teve, e isso é produto do que essa operação fez, jogando com o tema da honestidade do modo mais hipócrita possível, enquanto destruía o âmago de uma democracia”.

Leia a entrevista na íntegra